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O marxismo de 68

Traduzida por Reginaldo Gomes na revista LavraPalavra do 17 de junho 2022. Intervenção apresentada com o título “El 68 fue también marxista” como réplica à conferência “El 68 no fue marxista” de Patrick Llored, professor da Universidade de Lyon, em 31 de outubro de 2018, no Coloquio Internacional Movimientos Sociales: a 200 años de Marx y a 50 de los 68’s, realizado na Faculdade de Filosofia da Universidad Michoacana de San Nicolás de Hidalgo.

68 não foi só marxista

68 não foi só marxista. Foi também anarquista e feminista. Foi, às vezes, bastante apolítico, hippie, psicodélico e roqueiro. Foi, simplesmente, pacifista em seus protestos contra a Guerra do Vietnã ou antirracista no Movimento pelos Direitos Civis nos Estados Unidos. Foi, além disso, um espaço de gestação dos futuros movimentos ambientalistas e homossexuais, bem como um antecedente direto do partido pós-moderno e de sua alegre atitude pós-marxista ou antimarxista. O antimarxismo, de fato, já podia ser vislumbrado em algumas trincheiras de 1968.

Diversos grupos e movimentos de 68 se distanciaram do marxismo e, muitas vezes, o criticaram e a ele se opuseram. Algumas das referências e figuras emblemáticas do espírito sessentista não eram marxistas. É o caso, por exemplo, dos anarquistas Noam Chomsky nos Estados Unidos e Daniel Cohn-Bendit na França.

É claro, então, que 68 não foi só marxista, mas que foi muito mais coisas, algumas delas totalmente diferentes do marxismo e às vezes até diametralmente opostas a ele. Isso é incontestável.

68 foi também marxista

Agora, ainda que 68 não tenha sido só marxista, isso não significa, é claro, que ele não foi marxista. 68 foi também marxista. O marxismo foi um elemento definidor do espírito sessenta-e-oitista. Foi tão definidor que muitas testemunhas externas e inimigos do movimento de 68, tal como alguns de seus participantes, acabaram assimilando-o ao marxismo. Tal assimilação resulta certamente simplificadora, mas também reveladora, pois nos permite ver a importância que teve o elemento marxista no espírito sessenta-e-oitista.

O marxismo de 68 se pôs de manifesto no peso que adquiriu figuras como Marx e Engels junto com os marxistas favoritos do movimento: Rosa Luxemburgo e Trotsky, Che Guevara e Fidel Castro, Mao Tsé-Tung e Ho Chi Minh. Esses nomes nunca deixaram de ressoar em 1968. Seus respectivos rostos aparecem em todos os lados, em faixas e cartazes, em panfletos ou jornais de organizações. Suas palavras são constantemente citadas, interpretadas e discutidas.

Um grande número de sessenta-e-oitista de todo o mundo se auto-identificam, se reconhecem ou se distinguem uns dos outros ao se apresentarem como diferentes tipos de marxistas. Muitos ainda permanecem fiéis à União Soviético e são marxistas-leninistas de corte dogmático e tradicional, mas há cada vez mais quem se diferencie deles e os ultrapassem à extrema esquerda. Em primeiro lugar, há os marxistas libertários anti-leninistas e espartaquistas-luxemburguianos. Ao mesmo tempo, a revolução cultural chinesa, que eclodiu em 1966, dá origem a uma onda de maoístas em todo o mundo. Há também uma estranha proliferação de trotskistas, bem como há cada vez mais gramscianos e guevaristas. Essas diversas correntes políticas do marxismo dão lugar a organizações ultraesquerdistas que se aliam ou rivalizam entre si e que são protagonistas de muitos dos movimentos e acontecimentos de 1968.

O Maio Francês, por exemplo, será protagonizado principalmente por sete organizações marxistas de extrema esquerda, todas elas rivais do tradicional Partido Comunista Francês. Na trincheira trotskistas estão a Voz Operária e depois a Luta Operária, a Federação de Estudantes Revolucionários, a Organização Comunista Internacionalista e principalmente a Juventude Comunista Revolucionária, precedente da famosa Liga Comunista Revolucionária. A frente maoísta dispõe das Juventudes Comunistas Marxistas Leninistas e seu derivado, a Esquerda Proletária, vinculada a Louis Althusser. Enquanto o campo marxista libertário e antiautoritário, vinculado com os anarquistas e situacionistas, conta com o fabuloso Movimento 22 de Março.

As organizações tem, às vezes, líderes que são tão marxistas quanto elas e que haverão de se converter em ícones do espírito de 68. Pensemos agora, como ilustração, no mais conhecido sessenta-e-oitista alemão, Rudi Dutschke, marxista gramsciano, mas também luxemburguiano e altamente influenciado por filósofos marxistas ocidentais como Ernst Bloch e Marcuse, mas também paradoxalmente por Mao Tsé-Tung. É sob inspiração maoísta, com efeito, que Dutschke forja sua famosa noção de “longa marcha pelas instituições” com a qual se refere a uma estratégia de infiltração e subversão dos espaços institucionais desde o seu interior para restabelecer as condições da revolução.

O marxismo sessenta-e-oitista também se evidenciou, então, nos carismáticos dirigentes marxistas, figuras icônicas de 68, bem como na proliferação de grupos de corte marxista e na forma em que tais grupos englobaram uma fração importante do movimento estudantil. Mesmo fora dos espaços de militância comunista e socialista, houve uma enorme difusão de Marx e do marxismo entre os jovens mobilizados em todo o mundo. Tanto na França como na Alemanha, Itália, Japão e México, observamos a generalizada representação da realidade em termos de luta de classes ou de base e superestrutura e o emprego massivo dos nomes “capitalista” e “burguês” com propósitos insultantes ou desqualificadores. Tudo isso nos permite apreciar um ambiente altamente impregnado pelo marxismo. A impregnação é particularmente manifesta nos âmbitos universitários e acadêmicos.

O elemento marxista do espírito sessenta-e-oitista é também o de suas referências intelectuais. Temos aqui um marxismo renovado, radicalizado e tão ramificado como o das tendências políticas da época. Mencionemos ao menos o marxismo estruturalista de Louis Althusser, o existencialista de Jean-Paul Sartre, o hegeliano de Georg Lukács, o frankfurtiano de Max Horkeimer, Theodor Adorno e especialmente Herbert Marcuse, o historiográfico britânico de E. P. Thompson e Eric J. Hobsbawm, o humanista de Ernst Bloch, Erich Fromm, Karel Kosik, Lucien Goldmann e Roger Garaudy, o da teoria da dependência de Celso Furtado, Theotônio dos Santos, André Gunder Frank e Ruy Mauro Marini, os marxismos inclassificáveis de José Revueltas no México e Takaaki Yoshimoto no Japão. Os pensadores mais influentes de 68 foram em sua maioria marxistas, talvez heterodoxamente marxistas, mas marxistas, indiscutivelmente marxistas.

O discutível marxismo de 68

É verdade que também existiu em 1968 pensadores influentes cujo marxismo é discutível. Pensemos, por exemplo, no grupo marxista anti-dogmático Socialismo ou Barbárie, particularmente em seus líderes e fundadores, Cornelius Castoriadis e Claude Lefort. Sabemos que ambos, depois de terem se oposto unicamente ao marxismo-leninismo stalinista e soviético, tenderam a se distanciar de qualquer perspectiva marxista no decorrer dos anos sessenta. No entanto, na mesma época, esse distanciamento do marxismo provoca a cisão da facção de Pierre Souyri e Jean François Lyotard, que permanecem fiéis ao marxismo e terão um papel importante no movimento de 68 na França, especialmente através da revista Pouvoir Ouvrier.

De qualquer modo, mesmo no caso de Lefort e Castoriadis, o ponto de partida e o impulso vital de seu pensamento, assim como seu fundamento e quadro de referência, não deixam de ser profundamente marxistas. O mesmo ocorre, ainda que de modo ainda mais notório, com Guy Debord, cabeça de uma Internacional Situacionista que jogará um papel decisivo no Maio Francês. Ninguém irá colocar em questão que Debord funda suas ideias fabulosas em ideias muito precisas do próprio Marx, no projeto original de Socialismo ou Barbárie, na crítica da vida cotidiana do marxista humanista Henri Lefbvre, no freudomarxismo surrealista, e na perspectiva marxista ocidental de Georg Lukács e Karl Korsch. Todos esses materiais, ainda que provenientes do marxismo, já são em si relativamente incompatíveis com o marxismo-leninismo, mas são também articulados de uma forma tão original e com um estilo tão inovador e provocador que resultam desconcertantes e completamente irreconhecíveis para marxistas rígidos, convencionais e sensatos, para não dizer estúpidos e enfadonhos, como os que predominam nas estruturas e na direção do Partido Comunista Francês (PCF) e de seu tentáculo sindical, o da Confederação Geral do Trabalho (CGT).

Os velhos comunistas franceses viam os situacionistas sessenta-e-oitistas com desprezo e desconfiança. Não os levaram a sério. Não souberam aprender tudo o que lhes poderia ter sido ensinado. Não puderem encontrar neles mais do que a ideologia burguesa e o esquerdismo anarquista. Não foram capazes de vislumbrar seu marxismo tão autêntico e tão consequente, ainda que ali estivesse, não só presente, mas demasiado presente, transbordante, ampliado e aprofundado, ainda que certamente marcado por sua orientação libertária e imbricado com elementos anarquistas e com as ideias neo-marxistas ou para-marxistas de outros grandes expoentes do situacionismo, entre eles o famoso Raoul Vaneigem.

Marxismo e anarquismo

68 conseguiu libertar o marxismo de muito do que impedia sua reconciliação com o anarquismo. Isso foi possibilitado pela força que adquiriram os marxismos libertários, anti-dogmáticos e antiautoritários, como o espartaquistas-luxemburguiano, o conselhista, o do Socialismo ou Barbárie ou o situacionista. No entanto, no próprio fundamento mesmo da opção por esses marxismos e da reconciliação com o anarquismo, o decisivo foi o próprio espírito de 68, seu caráter insubmisso e subversivo que o fez desafiar qualquer poder opressivo e desembaraçar-se de tudo aquilo que o contrapõe ao anarquismo, como o burocratismo, o autoritarismo, o verticalismo, o vanguardismo e o despotismo que reinam tanto nos Partidos Comunistas como na União Soviética e em outros países socialistas.

De qualquer forma, o eterno conflito e mal-entendido entre marxistas e anarquistas, que vem desgastando-os desde o triste fim da Primeira Internacional e que assegura a fatídica divisão do movimento mundial anticapitalista, parece chegar a superar-se entre alguns sessenta-e-oitistas. Isso provoca a incompreensão dos velhos patriarcas do comunismo e do anarquismo. Isso pode ser visto muito claramente no Congresso Anarquista Internacional de Carrara, que acontece entre 31 de agosto e 5 de setembro de 1968 e no qual se cria a Internacional de Federações Anarquistas (IFA). Vemos se opor então a tradicional posição anti-marxista, representada principalmente pelo velho Maurice Joyeux, e a emergente postura pró-marxista, personificada pelo jovem sessenta-e-oitista Daniel Cohn-Bendit. A oposição entre essas duas posturas nos diz muito da relação entre o marxismo e o anarquismo em 1968 e merece que nos detenhamos nela por um momento.

O velho Joyeux se opõe violentamente a qualquer aliança com a “podridão marxista” e acusa os expoentes do marxismo libertário sessenta-e-oitista de “rondar o movimento libertário como putas ao redor dos bares”. Em resposta, depois de cantar várias vezes com seus companheiros “viva as putas! viva as putas! viva as putas!”, Cohn-Bendit expressa eloquentemente o espírito sessenta-e-oitista quando afirma: “temos que abandonar o falso dilema entre anarquistas e marxistas e colocar o dilema: revolucionários ou não”, e continua com firmeza: “o movimento revolucionário tem de basear-se na autogestão, nos conselhos operários, na rejeição da direção, seja ela exercida por um partido comunista ou por uma federação anarquista”.

Depois de terminar seu maravilhoso discurso, Cohn-Bendit abandona a sala com seu grupo de jovens, que agora cantam: “Vous êtes des anciens combattants!”, “Vocês são os velhos combatentes!”. Os velhos combatentes permanecem na sala e a tarefa de responder recai sobre outro anarquista de idade, nem mais nem menos que a veterana e ex-ministra da República Espanhola Federica Montseny, que, em tom condescendente e quase materno, disse a respeito do discurso de Cohn-Bendit: “eu pensava o mesmo que ele quando eu tinha vinte ou trinta anos”.

O cerne da questão é, pois, a lacuna geracional. Talvez Montseny tenha razão. Há algo em sua geração que normalmente a impede de compreender esses jovens de 68 que tentam mergulhar em suas convicções marxistas e anarquistas para superar suas diferenças e para cumprir assim com seus propósitos. Esse é também o espírito sessenta-e-oitista, o espírito que muitos de nós perdemos e cuja perda nos mantém derrotados ao manter o conflito estéril e interminável entre aqueles que ocupam sucessivamente as posições dos velhos marxistas e dos velhos anarquistas, sejam eles comunistas e libertários, populistas e trotskistas ou mesmo morenistas e zapatistas. Uns e outros não deixam de tropeçar entre si, boicotando-se constantemente uns aos outros, enquanto o capitalismo vai ganhando terreno e anulando todas as conquistas passadas.

Muito do que sofremos hoje em dia provém da incompreensão do espírito de 68. O espírito, incompreendido, acabou derrotado pela mesma incompreensão. O velho triunfou sobre o novo. O movimento revolucionário foi neutralizado pelo refluxo reacionário. Esse refluxo revestiu muitas formas diferentes, mas todas elas mostram uma total incompreensão em face dos diferentes aspectos do espírito de 68, entre eles seu elemento marxista.

Marxismo e marxismo

A incapacidade de compreender não só afeta severamente os velhos anarquistas da época, mas também os velhos marxistas. Já mencionamos os dinossauros do Partido Comunista Francês que não foram capazes nem sequer de vislumbrar, pelo menos no princípio, toda a radicalidade marxista dos jovens sessenta-e-oitistas, tanto os situacionistas como os ultraesquerdistas, os trotskistas, os maoístas e os anti-autoritários luxemburguianos. Exatamente o mesmo ocorre nos Estados Unidos, no México e na Tchecoslováquia. Detenhamo-nos por um momento em cada caso.

No contexto estadunidense, os velhos comunistas vão rotular ironicamente de “groucho marxistas” os yippies do Partido Internacional da Juventude. E sim, claro, é verdade que o marxismo dos yippies é discutível, para dizer o mínimo. Jerry Rubin, de fato, está mais próximo do anarquismo. No entanto, quando o escutamos, muitas vezes sentimos que seu discurso está muito mais próximo do marxismo, e seus heróis, não por acaso, são Fidel Castro, Mao Tsé-Tung e Ho Chi Min.

De sua parte, o outro yippie mais famoso, Abbie Hoffman, se descreve como um anarco-comunista, mas todo o seu pensamento está sob a influência indireta de Marx e direta de Marcuse, e, segundo o que ele mesmo disse, ele quer combinar os estilos de Andy Warhol com Fidel Castro, o que não é nada mau. Há aqui novamente um impulso para transgredir, subverter e unir o aparentemente incompatível: um impulso que pode chegar a ser libertador para o marxismo. Se isso não sucedeu, foi pela dissolução e recuperação do espírito de 68, embora também, insistamos, pela incompreensão da própria esquerda.

Mais ao sul, no contexto mexicano, há também múltiplos exemplos da mesma incompreensão, mas eu gostaria de me limitar a um que Roger Bartra nos relata e que me parece particularmente significativo. O protagonista foi o velho marxista Vicente Lombardo Toledano, que sempre esteve na órbita do governo pós-revolucionário, seja como político da ala esquerda do Partido Revolucionário Institucional (PRI) ou como primeiro secretário geral da central sindical governista da Confederação de Trabalhadores do México (CTM) ou como dirigente do paraestatal Partido Popular Socialista (PPS). Em primeiro de outubro de 1968, exatamente um dia antes do massacre de Tlatelolco, Lombardo Toledano quis repreender com severidade os jovens marxistas sessenta-e-oitistas e os acusou de se apresentarem como “reformadores do marxismo para caluniá-lo” e de abrir caminho para uma nova esquerda “por um caminho que não é o do marxismo-leninismo”. Talvez não fosse, de fato, a via leninista clássica, mas algo que Lênin teria julgado um infantilismo de esquerda precisamente por insistir no atalho e evitar qualquer tipo de desvio.

O certo é que o caminho dos sessenta-e-oitistas não era a senda tortuosa que seguiu Lombardo Toledano até o topo do poder. Mas isso não quer dizer que não tenha sido o caminho do marxismo, embora um caminho talvez efetivamente demasiado reto, demasiado consequente, demasiado juvenil e até infantil para ser compreendido pelo venerável ancião Lombardo Toledano, o qual, aliás, faleceu no mês de novembro de 1968, umas poucas semanas depois de repreender os jovens massacrados em Tlatelolco, os quais ele não foi capaz de compreender. Temos aqui, uma vez mais, a incompreensão de um velho diante do espírito de 68 e seu elemento marxista.

A velhice que atribuo ao velho Lombardo Toledano, assim como ao velho Maurice Joyeux ou aos velhos comunistas franceses e estadunidenses, não é evidentemente uma velhice biológica, mas histórica, simbólica, ideológica. É a velhice que nunca foi sofrida nem por Salvador Allende, o velho jovem, como ele mesmo se caracterizava, nem por outro dois marxistas que souberam compreender muito bem o marxismo sessenta-e-oitista mexicano. Me refiro, claro, a Elí de Gortari e especialmente a José Revueltas, os quais, embora bem carregados com respectivamente 50 e 54 anos nas costas, deram provas de uma juventude que os fez vibrar com o espírito de 68 até pagarem as consequências e terminaram encarcerados em Lecumberri.

Há alguém mais a quem desejo me referir, agora um tchecolosvaco, alguém que tampouco era precisamente jovem de idade biológica, mas que foi historicamente jovem ao compreender muito bem o marxismo sessenta-e-oitista. Estou pensando em Alexander Dubček, o principal artífice do 68 da Checoslováquia, da Primavera de Praga e do Socialismo com rosto humano. Os velhos marxistas tchecoslovacos e soviéticos acusaram Dubček e seus companheiros de não serem autênticos marxistas e de trair o marxismo. O certo é que não puderem evidenciar nem maior autenticidade em suas convicções marxistas nem maior insistência em sua fidelidade ao marxismo, como mostra claramente o Programa de ação de abril de 1968, no qual se resumem os princípios de sua proposta de Socialismo com rosto humano.

O que lemos no mencionado Programa de ação? Lemos que “se estimulará o desenvolvimento do pensamento marxista”, que “o conceito marxista-leninista de desenvolvimento do socialismo” deve ser “princípio reitor”, que “a gestão política” desse conceito é a condição para “o correto desenvolvimento de nossa sociedade socialista” e que a “ciência marxista” dará a força que “permite preparar condições científicas responsáveis para tal programa”. Se insiste assim uma e outra vez na profissão de fé marxista. Nada mau até aqui. O problema é que também lemos no mesmo programa que as “próprias experiências e o mesmo conhecimento científico marxista” os levaram a conclusão de que seu objetivo de plenitude pessoal e vital “não pode ser alcançado por velhos caminhos, ao usar meios que se tornaram métodos obsoletos e rígidos, que sempre nos estão arrastando”, e é por isso que decidem “abrir caminho através de condições desconhecidas, experimentar, dar um novo aspecto ao desenvolvimento socialista”, até “aprofundar o socialismo”, e sempre “apoiando-se em um pensamento marxista criativo”.

A criatividade é todo o problema do marxismo dos sessenta-e-oitista da Tchecoslováquia. Dubček e seus companheiros continuam sendo marxistas, autenticamente marxistas, insistentemente marxistas, apaixonadamente marxistas, mas o são de um modo criativo, inovador, novo, como seus companheiros do México, França e Estados Unidos, o que os torna incompreendidos e finalmente invadidos pela União Soviética e pelas demais nações do Pacto de Varsóvia. Desta vez, a incompreensão do marxismo de 68 se traduz em tanques e estilhaços. Melhor atirar em um lugar do que tentar compreendê-lo, o que provoca a indignação de partidos comunistas como o italiano, o francês e o finlandês, e assim termina preparando o terreno para o surgimento do eurocomunismo não alinhado com a União Soviética.

Entre a incompreensão e o reconhecimento do marxismo de 68

Não foi apenas a União Soviética que pagou muito caro pela incompreensão do marxismo sessenta-e-oitista. Essa incompreensão, na realidade, foi custosa e prejudicial para todos os que se nutrem da herança de Marx e de seus seguidores. Todos nós ficamos paralisados e presos em 68 e em suas consequências.

O imenso legado marxista chegou em 1968 a uma encruzilhada histórica decisiva da qual dependia seu destino: ou se desviava para voltar atrás e para seguir dando voltas, esgotando-se e ficando cada vez mais para trás, ou então seguia sempre adiante, o que exigia que ele se renovasse, se reinventasse, se radicalizasse, ou, nos termos dos companheiros tchecoslovacos, experimentasse, se aprofundasse e abrisse caminho através de condições desconhecidas. Esse caminho a seguir, o mesmo elegido por marxistas sessenta-e-oitistas do México e de todo o mundo, foi obstruído em Praga pelos tanques soviéticos, bem como foi também impedido em outros países pelo peso das velhas estruturas de partidos e dogmas comunistas, bem expressos pelas reconvenções que Lombardo Toledano dirigiu aos jovens mexicanos.

Os obstáculos existem no interior de cada organização e de cada membro. O movimento de 68, enquanto dura, se debate constantemente entre os dois caminhos ou entre o caminho e o obstáculo, entre o jovem e o velho, entre os marxismos renovados e os esclerosados. Isso fica muito claro no caso do Japão, onde vemos os jovens oscilando entre as velhas seitas marxistas Zengakuren, dogmáticas e ritualistas, e os novos Conselhos universitários de luta conjunta, os Zenkyoto, espaços únicos de liberdade e criatividade. Como em outros contextos, a experiência dos Zenkyoto é incompreendida e acaba sendo obstruída e finalmente frustrada pelas inércias dos Zengakuren.

O obstáculo da incompreensão dos próprios marxistas veio a se somar a todos os demais obstáculos do mundo capitalista. Contribuiu assim para a retirada desse espírito de 68 que poderia ter permitido ao marxismo dar um salto e seguir adiante. Certamente uma parte dele continuou se movendo através da noite neoliberal, pós-moderna e agora hipermoderna, mas ele sempre se moveu titubeando, cambaleando, aos tropeços, caindo e mancando, sem poder ainda se recuperar de suas múltiplas quedas. Ele mesmo não deixa de voltar atrás e se mantém no passado e segue tropeçando em si mesmo.

O avanço do marxismo exige reconhecer o marxismo sessenta-e-oitista. Este marxismo é ainda irreconhecível como tal, como um tipo de marxismo, para muitos marxistas. Eles não o compreendem. Ainda é demasiado novo, demasiado revolucionário, demasiado marxista, para os gostos marxistas majoritários de nossa época. Não conseguimos alcançá-lo. Ainda estamos atrás, muito atrás do socialismo com rosto humano da Tchecoslováquia, daquele pelo qual morreram os mártires de Tlatelolco, dos ideais de liberdade professados pelos yippies e pelos trotskistas, maoístas, espartaquistas e situacionistas de 68. Esses jovens marxistas eram demasiado jovens e nós já somos demasiado velhos.

Só estaremos em condições rejuvenescer, só poderemos renovar e reatualizar o que significa ser marxista para nós, depois que tivermos reconhecido o marxismo de 68, depois que tenhamos tomado consciência de tudo aquilo em que esse marxismo nos superou, ou seja, tudo aquilo em que estamos atrasados. O sinal deste atraso será precisamente seu desconhecimento. Não o conheceremos quando nem sequer vemos aquilo a respeito do qual nós estamos atrasados, quando não percebemos o marxismo em 68, quando não tomamos consciência de tudo aquilo que pode chegar a ser o marxismo sem deixar de ser o que é.

O certo é que o marxismo segue sendo o marxismo que é ao ser o de 68, ao desafiar o marxismo-leninismo soviético, ao ser maoísta e libertário, ao ser feminista e yippie, ao se reconciliar com o anarquismo, ao se converter em situacionismo e ao aprofundar-se tanto como o aprofundaram os sessenta-e-oitista. O espírito de 68 nos mostra muito do que pode vir a ser o marxismo e que hoje em dia ninguém ou quase ninguém reconhece como algo marxista, talvez porque os velhos acabaram vencendo, porque o movimento reacionário veio depois do movimento revolucionário e definiu o que deveria ser cada coisa, incluindo o próprio marxismo. Ficamos então unicamente com o superado e transcendido pelo espírito sessenta-e-oitista. Perdemos assim o marxismo de 68 para conservar apenas aquele marxista que o precedeu e contra o qual se rebelou.

Agora se tornou comum acreditar que o marxismo é tão somente isso que envelheceu e morreu na União Soviética. Esquecemos que foi também aquilo que pôde rejuvenescer no 68 e que assim conseguiu se sobrepor a sua velhice e a sua morte. A juventude e a vida do próprio marxismo é o que geralmente cai no esquecimento.

O que deixamos de recordar, em outras palavras, é a capacidade que tem o marxismo de se transformar para seguir constituindo a principal ameaça prático-teórica para o sistema capitalista e para os seus dispositivos ideológicos, disciplinares e repressivos. Isso é o que não se deve saber. É também pelo perigo de saber que não se nos permite reconhecer o marxismo de 68. Reconhecê-lo seria ver muito do que pode ser o marxismo além do que envelheceu e morreu na União Soviética. Melhor não vê-lo e imaginar que o superamos, que o deixamos para trás, que podemos nos resignar a pensamentos melhores adaptados ao capitalismo.

El marxismo del 68

Intervención presentada bajo el título “El 68 fue también marxista” como réplica para la conferencia “El 68 no fue marxista” de Patrick Llored, profesor de la Universidad de Lyon, el miércoles 31 de octubre de 2018, en el marco del Coloquio Internacional Movimientos Sociales: a 200 años de Marx y a 50 de los 68’s, realizado en la Facultad de Filosofía de la Universidad Michoacana de San Nicolás de Hidalgo.

David Pavón-Cuéllar

El 68 no fue sólo marxista

El 68 no fue sólo marxista. Fue también anarquista y feminista. Fue a veces más bien apolítico, hippie, psicodélico y roquero. Fue simplemente pacifista en sus protestas contra la Guerra de Vietnam o antirracista en el Movimiento por los Derechos Civiles en los Estados Unidos. Fue además espacio de gestación de los futuros movimientos ecologista y homosexual, así como también antecedente directo de la fiesta posmoderna y de su alegre actitud postmarxista o antimarxista. El antimarxismo, de hecho, ya se atisba en algunas trincheras de 1968.

Diversos grupos y movimientos del 68 se deslindaron del marxismo y a menudo lo criticaron y se opusieron a él. Algunas de las referencias y figuras emblemáticas del espíritu sesentayochero no eran marxistas. Es el caso, por ejemplo, de los anarquistas Noam Chomsky en Estados Unidos y Daniel Cohn-Bendit en Francia.

Es claro, pues, que el 68 no fue sólo marxista, sino que fue muchas cosas más, algunas de ellas totalmente diferentes del marxismo y a veces incluso diametralmente opuestas a él. Esto es incontestable.

El 68 fue también marxista

Ahora bien, aunque el 68 no fuera sólo marxista, esto no quiere decir, desde luego, que no fuera marxista. El 68 fue también marxista. El marxismo fue un elemento definitorio del espíritu sesentayochero. Fue tan definitorio que muchos testigos externos y enemigos del movimiento del 68, al igual que algunos de sus participantes, acabaron asimilándolo al marxismo. Tal asimilación resulta ciertamente simplificadora, pero también reveladora, pues nos deja ver la importancia que tuvo el elemento marxista en el espíritu sesentayochero.

El marxismo del 68 se puso de manifiesto en el peso que adquieren figuras como las de los propios Marx y Engels junto con los marxistas favoritos del movimiento: Rosa Luxemburgo y Trotsky, el Che Guevara y Fidel Castro, Mao Tse-Tung y Ho Chi Minh. Estos nombres no dejan de resonar en 1968. Sus rostros respectivos aparecen en todos lados, en mantas y pancartas, en panfletos o periódicos de organizaciones. Sus palabras no dejan de citarse, interpretarse y discutirse.

Un enorme número de sesentayocheros de todo el mundo se identifican a sí mismos y se reconocen o se distinguen unos de otros al presentarse como diferentes clases de marxistas. Muchos aún permanecen fieles a la Unión Soviética y son marxistas-leninistas de corte dogmático y tradicional, pero hay cada vez más que se distinguen de ellos y que los rebasan por la extrema izquierda. Están primeramente los marxistas libertarios anti-leninistas y espartaquistas-luxemburguianos. Al mismo tiempo, la revolución cultural china, que estalló en 1966, hace que se levante una ola de maoístas en todo el mundo. Hay también una extraña proliferación de trotskistas, así como cada vez más gramscianos y guevaristas. Estas diversas corrientes políticas del marxismo dan lugar a organizaciones ultraizquierdistas que se alían o rivalizan y que son protagonistas de muchos de los movimientos y acontecimientos de 1968.

El Mayo Francés, por ejemplo, será protagonizado principalmente por siete organizaciones marxistas de extrema izquierda, todas ellas rivales del más tradicional Partido Comunista Francés. En la trinchera trotskista están Voz Obrera y luego Lucha Obrera, la Federación de Estudiantes Revolucionarios, la Organización Comunista Internacionalista y principalmente la Juventud Comunista Revolucionaria, precedente de la famosa Liga Comunista Revolucionaria. El frente maoísta dispone de las Juventudes Comunistas Marxistas Leninistas y de su derivado, Izquierda Proletaria, vinculada con Louis Althusser. En cuanto al campo marxista libertario y antiautoritario, vinculado con los anarquistas y los situacionistas, cuenta con el fabuloso Movimiento del 22 de Marzo.

Las organizaciones tienen a veces líderes que son tan marxistas como ellas y que habrán de convertirse en íconos del espíritu del 68. Pensemos ahora, como ilustración, en el más conocido sesentayochero alemán, Rudi Dutschke, marxista gramsciano, pero también luxemburguiano y altamente influido por filósofos marxistas occidentales como Ernst Bloch y Marcuse, aunque también paradójicamente por Mao Tse-Tung. Es bajo inspiración maoísta, en efecto, que Dutschke forja su famosa noción de “larga marcha a través de las instituciones” con la que se refiere a una estrategia de infiltración y subversión de los espacios institucionales desde su interior para establecer las condiciones de la revolución.

El marxismo sesentayochero también se evidenció, pues, en los dirigentes marxistas carismáticos, figuras icónicas del 68, así como en la proliferación de grupos de corte marxista y en la forma en que tales grupos englobaron una fracción importante del movimiento estudiantil. Incluso al exterior de los espacios de militancia comunista y socialista, hubo una enorme difusión de Marx y del marxismo entre los jóvenes movilizados en todo el mundo. Lo mismo en Francia que en Alemania, Italia, Japón y México, observamos la generalizada representación de la realidad en términos de lucha de clases o de base y superestructura y el empleo masivo de los apelativos “capitalista” y “burgués” con propósitos insultantes o descalificadores. Todo esto nos permite apreciar un ambiente altamente impregnado por el marxismo. La impregnación es particularmente manifiesta en los ámbitos universitarios y académicos.

El elemento marxista del espíritu sesentayochero es también el de sus referentes intelectuales. Tenemos aquí un marxismo renovado, radicalizado y tan ramificado como el de las tendencias políticas de la época. Mencionemos al menos el marxismo estructuralista de Louis Althusser, el existencialista de Jean-Paul Sartre, el hegeliano de Georg Lukács, el frankfurtiano de Max Horkheimer, Theodor Adorno y especialmente Herbert Marcuse, el historiográfico británico de E. P. Thompson y Eric J. Hobsbawm, el humanista de Ernst Bloch, Erich Fromm, Karel Kosík, Lucien Goldmann y Roger Garaudy, el de la teoría de la dependencia de Celso Furtado, Theotonio Dos Santos, Andre Gunder Frank y Ruy Mauro Marini, los marxismos inclasificables de José Revueltas en México y Takaaki Yoshimoto en Japón. Los pensadores más influyentes del 68 fueron en su mayoría marxistas, quizás heterodoxamente marxistas, pero marxistas, indiscutiblemente marxistas.

El discutible marxismo del 68

Es verdad que también hubo en 1968 influyentes pensadores cuyo marxismo resulta discutible. Pensemos, por ejemplo, en el grupo marxista anti-dogmático Socialismo o Barbarie, particularmente en sus líderes y fundadores, Cornelius Castoriadis y Claude Lefort. Sabemos que ambos, después de haberse opuesto únicamente al marxismo-leninismo estalinista y soviético, tienden a distanciarse de cualquier perspectiva marxista en el curso de los años sesenta. Sin embargo, en la misma época, este distanciamiento del marxismo provoca la escisión de la facción de Pierre Souyri y Jean-François Lyotard, quienes permanecen fieles al marxismo y tendrán un papel importante en el movimiento del 68 en Francia, especialmente a través de la revista Pouvoir Ouvrier.

De cualquier modo, aun en el caso de Lefort y Castoriadis, el punto de partida y el impulso vital de su pensamiento, así como su fundamento y su marco de referencia, no dejan de ser profundamente marxistas. Es lo mismo que ocurre, aunque de modo aún más notorio, con Guy Debord, cabeza de una Internacional Situacionista que jugará un papel decisivo en el Mayo Francés. Nadie pondrá en duda que Debord funda sus ideas fabulosas en ideas muy precisas del propio Marx, en el proyecto original de Socialismo o Barbarie, en la crítica de la vida cotidiana del marxista humanista Henri Lefebvre, en el freudomarxismo surrealista y en la perspectiva marxista occidental de Georg Lukács y Karl Korsch. Todos estos materiales, aunque provenientes del marxismo, ya son de por sí relativamente incompatibles con el marxismo-leninismo, pero se articulan además de un modo tan original y con un estilo tan innovador y provocador que resultan desconcertantes y completamente irreconocibles para marxistas rígidos, convencionales y sensatos, por no decir tontos y aburridos, como los que predominan en las estructuras y dirigencias del Partido Comunista Francés (PCF) y de su tentáculo sindical, el de la Confederación General del Trabajo (CGT).

Los viejos comunistas franceses vieron a los situacionistas sesentayocheros con desprecio y desconfianza. No los tomaron en serio. No supieron aprender todo lo que habrían podido enseñarles. No pudieron encontrar en ellos más que ideología burguesa e izquierdismo anarquista. No fueron capaces de vislumbrar su marxismo tan auténtico y tan consecuente, aun cuando ahí estaba, no sólo presente, sino demasiado presente, desbordante, ampliado y profundizado, aunque ciertamente marcado por su orientación libertaria e imbricado con elementos anarquistas y con las ideas no-marxistas o para-marxistas de otros grandes exponentes del situacionismo, entre ellos el famoso Raoul Vaneigem.

Marxismo y anarquismo

El 68 consiguió liberar al marxismo de mucho de lo que impedía su reconciliación con el anarquismo. Esto fue posibilitado por la fuerza que adquieren marxismos libertarios, anti-dogmáticos y antiautoritarios, como el espartaquista-luxemburguiano, el consejista, el de Socialismo o Barbarie o el situacionista. Sin embargo, en el fundamento mismo de la opción por estos marxismos y de la reconciliación con el anarquismo, lo decisivo fue el espíritu mismo del 68, su carácter insumiso y subversivo que lo hace desafiar cualquier poder opresivo y desembarazarse de todo aquello que lo contrapone al anarquismo, como el burocratismo, el autoritarismo, el verticalismo, el vanguardismo y el despotismo que reinan lo mismo en los Partidos Comunistas que en la Unión Soviética y en otros países socialistas.

En cualquier caso, el eterno conflicto y malentendido entre marxistas y anarquistas, que viene desgastándolos desde el triste final de la Primera Internacional y que asegura la fatídica división del movimiento mundial anticapitalista, parece llegar a superarse entre algunos sesentayocheros. Esto provoca la incomprensión de los viejos patriarcas del comunismo y del anarquismo. Es algo que se aprecia muy bien en el Congreso Anarquista Internacional de Carrara, que se realiza entre el 31 de agosto y el 5 de septiembre de 1968 y en el que se crea la Internacional de Federaciones Anarquistas (IFA). Vemos oponerse entonces la tradicional posición antimarxista, representada principalmente por el viejo Maurice Joyeux, y la emergente postura pro-marxista, personificada por el joven sesentayochero Daniel Cohn-Bendit. La oposición entre estas dos posturas nos dice mucho de la relación entre el marxismo y el anarquismo en 1968 y merece que nos detengamos un momento en ella.

El viejo Joyeux se opone violentamente a cualquier alianza con la “podredumbre marxista” y acusa a los exponentes del marxismo libertario sesentayochero de “merodear en torno al movimiento libertario como putas en torno a los bares”. En respuesta, después de corear varias veces con sus compañeros “vive les putains!, ¡viva las putas!, ¡viva las putas!”, Cohn-Bendit expresa elocuentemente el espíritu sesentayochero cuando afirma: “hemos de abandonar el falso dilema anarquistas o marxistas y plantear el dilema: revolucionarios o no”, y continúa con firmeza: “el movimiento revolucionario tiene que basarse en la autogestión, en los consejos obreros, en el rechazo de la dirección, tanto si la ejerce un partido comunista como si lo hace una federación anarquista”.

Después de terminar su maravilloso discurso, Cohn-Bendit abandona la sala con su grupo de jóvenes, quienes corean ahora: “Vous êtes des anciens combattants!”, “¡Son ustedes unos viejos combatientes!”. Los viejos combatientes se quedan en la sala y el encargo de responder cae en otra anarquista de edad, ni más ni menos que la veterana y exministra de la República Española Federica Montseny, la cual, en tono condescendiente y casi materno, dice con respecto al discurso de Cohn-Bendit: “yo pensaba igual que él cuando tenía veinte o treinta años”.

El meollo del asunto es, pues, la brecha generacional. Quizás Montseny tenga razón. Hay algo en su generación que suele impedirle comprender a esos jóvenes del 68 que intentan ahondar en sus convicciones marxistas y anarquistas para superar sus diferencias y para cumplir así con sus propósitos. Esto es también el espíritu sesentayochero, el espíritu que muchos hemos perdido y cuya pérdida nos mantiene derrotados al mantener el conflicto estéril e interminable entre quienes van ocupando sucesivamente las posiciones de los viejos marxistas y de los viejos anarquistas, ya sean comunistas y libertarios, populistas y trotskistas o hasta morenistas y zapatistas. Unos y otros no dejan de tropezar entre sí, boicoteándose constantemente los unos a los otros, mientras el capitalismo va ganando terreno y anulando todas las conquistas pasadas.

Mucho de lo que sufrimos hoy en día proviene de la incomprensión del espíritu del 68. El espíritu, incomprendido, terminó derrotado por la misma incomprensión. Lo viejo triunfó sobre lo nuevo. El movimiento revolucionario fue neutralizado por el reflujo reaccionario. Este reflujo revistió muchas formas diferentes, pero todas ellas muestran una total incomprensión ante los diferentes aspectos del espíritu del 68, entre ellos su elemento marxista.

Marxismo y marxismo

La incapacidad para comprender no sólo afecta severamente a los viejos anarquistas de la época, sino también a los viejos marxistas. Ya mencionamos a los dinosaurios del Partido Comunista Francés que no fueron capaces ni siquiera de vislumbrar, al menos al principio, toda la radicalidad marxista de los jóvenes sesentayocheros, tanto los situacionistas como los ultraizquierdistas, los trotskistas, los maoístas y los anti-autoritarios luxemburguianos. Exactamente lo mismo ocurre en los Estados Unidos, en México y en Checoslovaquia. Detengámonos un momento en cada caso.

En el contexto estadounidense, los viejos comunistas van a tildar burlonamente de “groucho marxistas” a los yippies del Partido Internacional de la Juventud. Y sí, claro, es verdad que el marxismo de los yippies es discutible, por decir lo menos. Jerry Rubin, de hecho, está más próximo al anarquismo. Sin embargo, cuando lo escuchamos, a menudo sentimos que su discurso está mucho más cerca del marxismo, y sus héroes, no por casualidad, son Fidel Castro, Mao Tse-Tung y Ho Chih Min.

Por su parte, el otro yippie más famoso, Abbie Hoffman, se describe como un anarco-comunista, pero todo su pensamiento está bajo la influencia indirecta de Marx y directa de Marcuse, y, según él mismo dice, quiere combinar los estilos de Andy Warhol con Fidel Castro, lo que no está nada mal. Hay aquí nuevamente un impulso a transgredir, subvertir y unir lo aparentemente incompatible: un impulso que pudo llegar a ser liberador para el marxismo. Si esto no sucedió, fue por la disolución y recuperación del espíritu del 68, aunque también, insistamos, por la incomprensión en la misma izquierda.

Más al sur, en el contexto mexicano, hay también múltiples ejemplos de la misma incomprensión, pero me gustaría ceñirme a uno que nos relata Roger Bartra y que me parece particularmente significativo. El protagonista fue el viejo marxista Vicente Lombardo Toledano, quien siempre estuvo en la órbita del gobierno posrevolucionario, ya fuera como político del ala izquierdista del Partido Revolucionario Institucional (PRI) o como primer secretario general de la central sindical oficialista Confederación de Trabajadores de México (CTM) o como dirigente del paraestatal Partido Popular Socialista (PPS). El primero de octubre de 1968, exactamente un día antes de la matanza de Tlatelolco, Lombardo Toledano quiso reprender con severidad a los jóvenes marxistas sesentayocheros y los acusó de presentarse como “reformadores del marxismo para calumniarlo” y de abrir paso a una nueva izquierda “por un camino que no es el del marxismo-leninismo”. Quizás no fuera, en efecto, la vía leninista clásica, sino algo que Lenin habría juzgado un infantilismo de izquierda precisamente por insistir en el atajo y evitar cualquier tipo de rodeo.

Lo seguro es que el camino de los sesentayocheros no era la senda tortuosa que siguió Lombardo Toledano hasta la cima del poder. Pero esto no quiere decir que no fuera el camino del marxismo, aunque un camino tal vez efectivamente demasiado recto, demasiado consecuente, demasiado juvenil y hasta infantil para ser comprendido por el venerable anciano Lombardo Toledano, el cual, por cierto, falleció en el mes de noviembre de 1968, tan sólo unas semanas después de reprender a los jóvenes a los que masacraron en Tlatelolco y a los que no supo comprender. Tenemos aquí, una vez más, la incomprensión de un viejo ante el espíritu del 68 y su elemento marxista.

La vejez que le achaco al viejo Lombardo Toledano, lo mismo que al viejo Maurice Joyeux o a los viejos comunistas franceses y estadounidenses, no es evidentemente una vejez biológica, sino histórica, simbólica, ideológica. Es la vejez que nunca fue sufrida ni por Salvador Allende, el viejo joven, como él mismo se caracterizaba, ni por otros dos marxistas que supieron comprender muy bien el marxismo sesentayochero mexicano. Me refiero, desde luego, a Elí de Gortari y especialmente José Revueltas, los cuales, aunque bien cargados respectivamente con 50 y 54 años a cuestas, dieron prueba de una juventud que les hizo vibrar con el espíritu del 68 hasta pagar las consecuencias y terminar encarcelados en Lecumberri.

Hay alguien más a quien deseo referirme, ahora un checoslovaco, alguien que tampoco era precisamente joven de edad biológica, pero que fue históricamente joven al comprender muy bien el marxismo sesentayochero. Estoy pensando en Alexander Dubček, el principal artífice del 68 de Checoslovaquia, de la Primavera de Praga y del Socialismo con rostro humano. Los viejos marxistas checoslovacos y soviéticos acusaron a Dubček y a sus compañeros de no ser auténticos marxistas y de traicionar el marxismo. Lo cierto es que no podían evidenciar ni mayor autenticidad en sus convicciones marxistas ni mayor insistencia en su fidelidad al marxismo, como lo muestra claramente el Programa de acción de abril de 1968, en el que se resumen los principios de su propuesta de Socialismo con rostro humano.

¿Qué leemos en el mencionado Programa de acción? Leemos que “se estimulará el desarrollo del pensamiento marxista”, que “el concepto marxista-leninista del desarrollo del socialismo” debe ser “principio rector”, que “la gestión política” de este concepto es condición para “el correcto desarrollo de nuestra sociedad socialista” y que la “ciencia marxista” dará la fuerza que “permita preparar condiciones científicas responsables para tal programa”. Se insiste así una y otra vez en la profesión de fe marxista. Nada malo hasta aquí. El problema es que también leemos en el mismo programa que las “propias experiencias y el mismo conocimiento científico marxista” los han llevado a la conclusión de que su objetivo de plenitud personal y vital “no puede lograrse por viejos caminos, al usar medios que han sido métodos obsoletos y duros, que siempre nos están arrastrando”, y es por eso que deciden “abrirse camino a través de condiciones desconocidas, experimentar, darle un nuevo aspecto al desarrollo socialista”, incluso “profundizar el socialismo”, y siempre “apoyándose en un pensamiento marxista creativo”.

La creatividad es todo el problema del marxismo de los sesentayocheros de Checoslovaquia. Dubček y sus compañeros continúan siendo marxistas, auténticamente marxistas, insistentemente marxistas, apasionadamente marxistas, pero lo son de un modo creativo, innovador, nuevo, como sus compañeros de México, Francia y Estados Unidos, lo que les vale ser incomprendidos y finalmente invadidos por la Unión Soviética y por las demás naciones del Pacto de Varsovia. Esta vez la incomprensión del marxismo del 68 se traduce en tanques y metrallas. Mejor disparar en lugar de intentar comprender, lo que provoca la indignación de partidos comunistas como el italiano, el francés y el finlandés, y así termina preparando el terreno para el surgimiento del eurocomunismo no alineado con la Unión Soviética.

Entre la incomprensión y el reconocimiento del marxismo del 68

No fue solamente la Unión Soviética la que pagó muy cara la incomprensión del marxismo sesentayochero. Esta incomprensión, en realidad, ha sido costosa y perjudicial para todos los que se nutren de la herencia de Marx y de sus seguidores. Todos nos hemos quedado como paralizados y atrapados en el 68 y en sus consecuencias.

El inmenso legado marxista llegó en 1968 a una encrucijada histórica decisiva de la que dependía su destino: o se desviaba para volver atrás y para seguir dando vueltas, agotándose y quedando cada vez más atrás, o bien seguía siempre adelante, lo que le exigía renovarse, reinventarse, radicalizarse, o, según los términos de los compañeros checoslovacos, experimentar, profundizarse y abrirse camino a través de condiciones desconocidas. Este camino hacia adelante, el mismo elegido por los marxistas sesentayocheros de México y de todo el mundo, fue obstruido en Praga por los tanques soviéticos, así como fue también estorbado en otros países por el peso de las vetustas estructuras de partidos y dogmas comunistas, bien expresadas por las reconvenciones que Lombardo Toledano dirigió a los jóvenes mexicanos.

Los estorbos existen al interior de cada organización y de cada miembro. El movimiento del 68, mientras dura, se debate constantemente entre los dos caminos o entre el camino y el obstáculo, entre lo joven y lo viejo, entre los marxismos renovados y los anquilosados. Esto es muy claro en el caso de Japón, en donde vemos oscilar a los jóvenes entre las viejas sectas marxistas Zengakuren, dogmáticas y ritualistas, y los nuevos Consejos universitarios de lucha conjunta, los Zenkyoto, espacios únicos de libertad y creatividad. Como en otros contextos, la experiencia de los Zenkyoto es incomprendida y termina siendo estorbada y finalmente frustrada por las inercias de los Zengakuren.

El obstáculo de la incomprensión de los propios marxistas vino a sumarse a todos los demás obstáculos del mundo capitalista. Contribuyó así al repliegue de ese espíritu del 68 que pudo haberle permitido al marxismo dar un salto y seguir adelante. Ciertamente una parte de él continuó moviéndose a través de la noche neoliberal, posmoderna y ahora hipermoderna, pero se ha movido siempre titubeando, tambaleándose, trastabillando, cayendo y cojeando, sin poder aún recobrarse de sus múltiples caídas. Él mismo no deja de volver atrás y se retiene en el pasado y sigue tropezando con él mismo.

El avance del marxismo exige reconocer el marxismo sesentayochero. Este marxismo es aún irreconocible como tal, como un tipo de marxismo, para muchos marxistas. No lo comprenden. Es todavía demasiado nuevo, demasiado revolucionario, demasiado marxista, para los gustos marxistas mayoritarios de nuestra época. No hemos conseguido alcanzarlo. Aún estamos atrás, muy atrás del socialismo con rostro humano de Checoslovaquia, de aquello por lo que murieron los mártires de Tlatelolco, de los ideales de libertad profesados por los yippies y por los trostkistas, maoístas, espartaquistas y situacionistas del 68. Estos jóvenes marxistas eran demasiado jóvenes y nosotros ya somos demasiado viejos.

Tan sólo estaremos en condiciones de rejuvenecer, tan sólo podremos renovar y reactualizar lo que significa ser marxistas para nosotros, después de que hayamos reconocido el marxismo del 68, después de que hayamos tomado conciencia de todo aquello en lo que ese marxismo nos ha superado, es decir, todo aquello en lo que nos hemos ido rezagando. El signo de este rezago será precisamente su desconocimiento. Lo desconoceremos cuando ni siquiera veamos aquello con respecto a lo cual estamos rezagados, cuando no percibamos el marxismo en el 68, cuando no hayamos tomado conciencia de todo aquello que puede llegar a ser el marxismo sin dejar de ser lo que es.

Lo cierto es que el marxismo sigue siendo el marxismo que es al ser el del 68, al desafiar el marxismo-leninismo soviético, al ser maoísta y libertario, al ser feminista y yippie, al reconciliarse con el anarquismo, al convertirse en situacionismo y al profundizarse tanto como lo profundizaron los sesentayocheros. El espíritu del 68 nos muestra mucho de lo que puede llegar a ser el marxismo y que hoy en día nadie o casi nadie reconoce como algo marxista, quizás porque terminaron ganando los viejos, porque el movimiento reaccionario vino después del movimiento revolucionario y definió lo que habría de ser cada cosa, incluido el propio marxismo. Nos quedamos entonces únicamente con lo superado y trascendido por el espíritu sesentayochero. Perdimos así el marxismo del 68 para conservar tan sólo aquello marxista que lo precedió y contra lo que se rebeló.

Ahora suele creerse que el marxismo es tan sólo eso que envejeció y murió en la Unión Soviética. Se nos olvida que fue también aquello que pudo rejuvenecer en el 68 y que así consiguió sobreponerse a su vejez y a su muerte. La juventud y la vida misma del marxismo es lo que suele caer en el olvido.

Lo que dejamos de recordar, en otras palabras, es la capacidad que tiene el marxismo de transformarse a sí mismo para seguir constituyendo la principal amenaza práctico-teórica para el sistema capitalista y para sus dispositivos ideológicos, disciplinarios y represivos. Esto es lo que no debe saberse. Es también por el peligro de saberlo que no se nos permite reconocer el marxismo del 68. Reconocerlo sería ver mucho de lo que puede ser el marxismo además de lo que envejeció y murió en la Unión Soviética. Mejor no verlo e imaginar que lo superamos, que lo dejamos atrás, que podemos resignarnos a pensamientos mejor adaptados al capitalismo.

Bolsonaro y su verdad

Artículo publicado en Rebelión del 25 de octubre de 2018 y en la edición michoacana de Revolución 3.0 del 21 de octubre del mismo año

David Pavón-Cuéllar

¿Quién es Bolsonaro?

Jair Bolsonaro es un político brasileño de extrema derecha. Es un homófobo que promueve leyes contra la homosexualidad y prefiere a un hijo “muerto” que homosexual. Es también un machista que estima que el salario de las mujeres debe ser menor al de los hombres y que no duda en gritarle a una diputada que no la viola porque está “muy fea”.

Bolsonaro es un xenófobo que desea usar a las fuerzas armadas para “hacer frente” a los inmigrantes bolivianos, haitianos, senegaleses y sirios, a los que describe como “escoria del mundo”. Es, además, un racista que lamenta que “indios hediondos” posean territorios propios, anuncia que ya “no habrá un centímetro” de tierra para las comunidades indígenas y afrodescendientes, asegura que sus hijos no podrían enamorarse de una mujer de color porque “están bien educados” y afirma que los negros “no hacen nada” y que “ni para procreadores sirven ya”.

Bolsonaro es un ecocida potencial que promete “poner un punto final” a cualquier “activismo ambiental”, acabar con leyes e instituciones que frenan la deforestación del Amazonas y sacar a Brasil del Acuerdo de París para la reducción de las emisiones de gases de efecto invernadero. Es, en fin, un potencial tirano, apologista de la violencia, del asesinato y la tortura, que juzga la democracia como un sistema “de mierda”, expresa que sólo un gobierno militar podría conducir a un país “más próspero y sostenible”, ensalza la dictadura en Brasil como una época “gloriosa” de “orden y progreso”, considera que el único error de la dictadura fue “torturar y no matar”, piensa que Pinochet “debió haber matado a más gente” y que la policía brasileña “tendría que matar más”, advierte que va a “fusilar” a sus rivales políticos y amenaza con “dar un golpe” y “cerrar el Congreso”.

¿Un comediante?

El ultraderechista Bolsonaro representa, en suma, una estremecedora conjunción de racismo, xenofobia, machismo, homofobia, culto a la violencia, riesgo de tiranía y hasta amenaza de ecodicio. Todo esto, que basta y sobra para considerarlo un patente caso de neofascismo y un grave peligro para el mundo, se desprende claramente de sus declaraciones y promesas de campaña. Él mismo nos confiesa con franqueza lo que es. ¿Por qué dudaríamos de él?

Es verdad que Bolsonaro nos advirtió recientemente que es “un comediante” y que no se le debe “tomar en serio”. Concedamos que no hay que tomarlo en serio cuando nos dice que no hay que tomarlo en serio. Sin embargo, acatando su voluntad, el resto del tiempo sí que debemos escucharlo con seriedad. Se tiene que atender seriamente a lo que hace aun cuando parece estar jugando con sus presas.

El estilo humorístico de Bolsonaro es el mismo de Trump y de otros ultraderechistas. Les permite decir lo inadmisible y volverlo admisible al colorearlo de humor y al hacer como si no fuera de verdad. Como bien lo ha señalado el filósofo brasileño Vladimir Safatle al referirse al mismo Bolsonaro, “uno ironiza la violencia mientras destroza a todo el mundo, porque si se asumiera una ética de la convicción, nadie lo soportaría”.

Las ideas y su respaldo social

Soportamos lo que dice Bolsonaro porque lo reducimos a “chistes y frases imbéciles”, como lo hace otro filósofo brasileño, Gustavo Bertoche Guimarães, quien imagina que hay que escribir Mein Kampf para volverse tan peligroso como Hitler. Esta idea no debería tranquilizarnos por dos razones. Por un lado, como se ha visto en múltiples casos históricos, puede haber una división del trabajo por la que un intelectual como el ultraderechista Olavo de Carvalho se ocupe de Mein Kampf: de la elaboración y sistematización de lo personificado por un líder como Bolsonaro. Por otro lado, el peligro no está, de cualquier modo, en el hecho de elaborar y sistematizar las ideas, sino en las ideas mismas y en el apoyo que alcanzan a tener en la sociedad.

Por desgracia, en el caso de Bolsonaro, la peligrosidad se encuentra lo mismo en las convicciones extremas que en el enorme respaldo social. Este respaldo no es tan sólo, como supone igualmente Guimarães, “anticorrupción”, “antisistema” y “antiizquierda”. Es también claramente antidemocrático, anti-negro, anti-indígena y anti-homosexual, como puede comprobarse en los torrentes de opiniones racistas y homófobas de simpatizantes de Bolsonaro que circulan en periódicos y redes sociales, así como en la ola de agresiones de bolsonaristas contra personas de color y del colectivo LGBT, incluyendo asesinatos como el del maestro de capoeira Moa del Katendê, el 7 de octubre en Salvador de Bahia, o el de una mujer trans, al grito de “¡Bolsonaro sí!”, el 16 de octubre en el centro de Sao Paulo.

Hay un amplio sector de la sociedad brasileña que siente, piensa, ejecuta y realiza lo que Bolsonaro expresa en sus polémicas declaraciones. Digamos que la palabra de Bolsonaro no está vacía porque él no está solo, porque sus ideas no son únicamente suyas, porque las comparte con una muchedumbre de seguidores. Es también por esto que se trata de alguien tan peligroso al que debemos tomar tan en serio: porque no es ni un simple individuo aislado ni mucho menos un inofensivo comediante, sino el nombre y la cara de un inmenso movimiento neofascista que amenaza lo mismo a los negros que a los indígenas, las mujeres, los homosexuales e incluso al planeta mismo, al que se le pretende arrancar su pulmón amazónico.

Verdad y mentira de Bolsonaro

Es en el respaldo social en el que debemos buscar la verdad subyacente a lo manifestado por Bolsonaro. Esta verdad tendría que interesarnos más que la mentira con la que simultáneamente se encubre y se descubre. De nada sirve repetir que el discurso de Bolsonaro es tramposo y engañoso, que es el mejor ejemplo de posverdad, que se basa en puras fake news y manipulaciones de la realidad. Todo esto es innegable, pero no es lo importante.

Lo que importa no es que Bolsonaro mienta constantemente, lo que nadie sensato ignora, sino que logre persuadir con su mentira, lo cual, si no se quiere subestimar el criterio de quienes se dejan persuadir, tan sólo puede explicarse por la existencia de una verdad que esté revelándose a pesar y a través de la mentira. Esta verdad en la mentira es la que persuade, complace, apasiona y permite ganar elecciones. Es una verdad tan atrayente como la que se exterioriza en la ficción de las películas más taquilleras: las de vampiros que nos recuerdan lo que sufrimos ante el capital que nos acecha y absorbe nuestra vida, las de zombis en las que alcanzamos a vislumbrar nuestro comprensible terror ante aquello a lo que nos vemos reducidos en el capitalismo, las de catástrofes naturales planetarias en las que adivinamos nuestra ansiedad ante el destino del mundo imparablemente destruido por el sistema capitalista. En todos los casos, cumpliéndose la regla aristotélica de la catarsis dramática, las películas nos ofrecen la experiencia de lo que no podemos experimentar de otro modo, es decir, lo que nuestra condición enajenada e ideologizada nos impide conocer de una manera más crítica y racional que tal vez nos permitiría pensar en lo que experimentamos, cuestionar lo que deba cuestionarse y luchar contra lo que haya que luchar.

Las películas de Hollywood se valen de sus patrañas para neutralizarnos al tiempo que nos dejan ver profundas verdades relativas a nuestra experiencia. Es también por esto que son tan cautivadoras. De igual modo, si Bolsonaro puede llegar a ser tan seductor para un amplio sector de la sociedad brasileña, es porque algo verdadero le está confesando al mentirle sin parar. Lo que está confesando es algo que también puede verse en películas de Hollywood, algo inconfesable que la sociedad siente, algo vergonzoso que muchos brasileños nunca dejaron de experimentar, algo siniestro que reina secretamente en el mundo: la fascinación por la violencia, el desprecio del otro, el deseo de sumisión, la mezquindad y la ambición, las pulsiones de muerte y destrucción, el racismo y la xenofobia, la homofobia y el machismo.

Ideal realista

Entre las opiniones que expresan los bolsonaristas, hay múltiples variantes de un mismo argumento que suele dejar pasmados y desarmados a quienes pretenden refutarlo: aquello que nos asusta en Bolsonaro es lo mismo que se ha vivido en los últimos años, incluso en los gobiernos de izquierda, los del Partido del Trabajo, los de Lula y Dilma. En los últimos quince años, en efecto, no ha cesado todo lo que se teme de Bolsonaro: la destrucción de la selva amazónica, la violencia de la policía, los crímenes homofóbicos y transfóbicos, los feminicidios y otras formas de violencia machista y misógina contra las mujeres, el desprecio racista y neocolonial hacia indígenas y afrodescendientes. Es como si todo esto fuera inevitable y sólo Bolsonaro tuviera el valor y la franqueza de asumirlo como programa de gobierno. De ahí que se le prefiera. Sus seguidores menos insensatos argumentan de manera bastante convincente: mejor un cínico veraz que otro hipócrita demagógico y respetuoso de lo políticamente correcto.

Los votantes de Bolsonaro se consideran defraudados por los anteriores gobernantes y están seguros de que su nuevo candidato no los decepcionará. De algún modo tienen razón. Bolsonaro no podría llegar a decepcionarlos porque sólo sabe prometerles el racismo, la xenofobia, el machismo, la homofobia, la violencia, el ecocidio y todo lo demás que ya existe a su alrededor.

Lo existente es, paradójicamente, aquello a lo que aspira Bolsonaro. Lo más lejos a lo que puede llegar su deseo es a la acentuación, intensificación, agravación y aceleración de lo que sucede y nos rodea, pero no a su transformación. ¿Por qué habría que transformar lo que acontece día tras día? Tan sólo hay que darle rienda suelta. Éste es el único ideal bolsonarista: más de lo mismo, es decir, más violencia, más desprecio, más destrucción de la naturaleza, más de todo lo que ya hay. Estamos aquí ante un extraño conformismo extremista que adhiere fanáticamente a la realidad.

Neofascismo como síntoma del neoliberalismo

El ideal bolsonarista coincide misteriosamente con el mundo real. Es una opción idealista por una realidad que no es otra que la que todos ya padecemos, la del sistema capitalista violento y ecocida, neoliberal y neocolonial, patriarcal y heteronormativo. Las opciones de este capitalismo son las de Bolsonaro, pero lo son desvergonzadamente, cínicamente, pues el rasgo característico de la ultraderecha, tanto fascista como neofascista, es revelar de modo sintomático la verdad propia del capital que suele disimularse tanto en el viejo liberalismo como en el neoliberalismo.

Lo que neoliberales como Temer, Duque, Macri, Piñera o Peña Nieto disimulan es lo que se revela sintomáticamente en el neofascista Bolsonaro, el cual, por lo mismo, cuenta con el apoyo incondicional de la oligarquía brasileña. Los dueños del dinero escuchan el susurro más íntimo de sus corazones en las invectivas de Bolsonaro. Como ya intenté demostrarlo en el caso de Trump, si el neofascismo es el retorno de lo políticamente incorrecto, es porque representa, como el síntoma en Freud, un retorno de lo reprimido: una reaparición de lo disimulado en el neoliberalismo, de su verdad secreta, de lo encubierto por lo políticamente correcto. El discurso neofascista pone de manifiesto el retorno de aquello que, aunque reprimido, siempre estuvo ahí en el capitalismo neoliberal y en su funcionamiento violento, destructor, mortífero, ecocida, etc.

El capital, por ejemplo, como lo han demostrado Marx y sus seguidores, no puede operar sin destruir y sin matar, sin convertir lo vivo en algo muerto, la naturaleza orgánica y la fuerza humana de trabajo en más y más dinero inorgánico e inanimado. Es de esta muerte, de esta conversión de lo vivo en lo muerto, de la que vive paradójicamente el sistema capitalista. Es aquí en donde estriba su verdad inconfesable que sólo se revela sintomáticamente con los fascistas y los neofascistas, con Millán Astray y la consigna franquista de “¡Viva la muerte!” o con la insistencia patológica de Bolsonaro en que Pinochet debió matar más, la dictadura brasileña debió matar más, la policía debería matar más, etc. Esta máxima de matar más, como la de acabar aún más rápido con el pulmón amazónico del que todos respiramos y vivimos, no es más que la sincera proclamación del imperativo categórico del vampiro del capital, el imperativo de consumir cada vez más vida para producir más y más muerte, un imperativo escandaloso que suele ser bien disimulado en los discursos políticamente correctos de los dirigentes neoliberales.

El capitalismo y su exceso neofascista

Para hacer consciente la verdad inconsciente del capitalismo, requerimos del fascismo, así como ahora es necesario el discurso neofascista de alguien como Bolsonaro para tomar conciencia de la verdad latente del sistema capitalista en su fase neoliberal. Quizás debiéramos estar agradecidos con el programa destructivo de Bolsonaro porque vuelve manifiesto lo que subyace a los discursos demagógicos del neoliberalismo que pretenden proteger lo que destruyen. Sin embargo, si Bolsonaro consigue delatar así a los neoliberales, no es tanto por afán de veracidad, sino más bien, como ya lo señalamos, por su funesto propósito de acentuar y acelerar la destrucción capitalista.

Es por su aspecto excesivo que el síntoma fascista nos descubre su fondo capitalista liberal y ahora neoliberal, anárquico y destructivo, lo que ya fue comprendido muy bien por Franz Neumann, hace más de medio siglo, y lo que han venido a confirmar Trump, Viktor Orban, Geert Wilders y otros ultraderechistas neoliberales. El último de ellos es Bolsonaro, el cual, llegando aún más lejos que los demás, nos ofrece una versión todavía más impúdica del neofascismo y además entronca directamente con cinco siglos de historia latinoamericana de la infamia capitalista en sus fases mercantil-colonial, industrial-imperialista y ahora financiera-imperial-neocolonial. El rostro de Bolsonaro nos resulta ya bastante conocido en América Latina: es un viejo rostro de conquistador, encomendero, cacique, terrateniente, hacendado, tirano, dictador, torturador, paramilitar, militar asesino, delincuente uniformado o de cuello blanco, gobernante corrupto y vendepatria, patrón insaciable y empresario sin escrúpulos.

Bolsonaro es la síntesis de todo lo que ha impedido que América Latina levante el vuelo. Es lo que no ha dejado que seamos lo que podemos llegar a ser. Es lo que nos ha puesto a disposición del mejor postor, lo que nos ha traicionado, lo que nos ha vendido, lo que nos ha saqueado y explotado, lo que nos ha discriminado y segregado, lo que nos ha despreciado, humillado, prostituido, violado, torturado, asesinado y desaparecido.

La vida contra la muerte

Si Bolsonaro es todo lo que es en el contexto latinoamericano, lo es al personificar el capital que está realizando la destrucción tanto de la naturaleza con sus especies diversas como de la humanidad en toda su diversidad racial, cultural y sexual. Este doble proceso destructor es el revelado por Bolsonaro. Al revelárnoslo, nos enseña ciertamente lo que el sistema capitalista es para nosotros, pero también, derivativamente, lo que somos nosotros para el capitalismo.

Aprendemos lo que somos para el capital en el sincero discurso de Bolsonaro. Sus palabras nos hacen reconocernos como las víctimas de lo que delatan. El capitalismo no aparece aquí sin mostrar lo que destruye. Nos descubre así a nosotros: mujeres, afrodescendientes, indígenas, homosexuales, extranjeros y extranjeras, simplemente humanos, pero también animales y vegetales, ya que si los árboles y los monos y las demás especies del amazonas y del resto del mundo pudieran votar, lo harían seguramente contra el capitalismo y contra Bolsonaro, es decir, contra lo que amenaza con aniquilarlos.

Amenazándonos abiertamente a todos nosotros, Bolsonaro nos recuerda la vida que nos une ante el impulso mortífero del capital que habla sin ambages por su boca. El portavoz, obsesionado con matar, nos enseña lo que nos quiere quitar, lo que somos, lo que nos hermana. Es así como puede hacer brotar nuestra conciencia de clase en su más alto nivel de universalidad, el de la conciencia de los vivos, conciencia contra la pulsión de muerte que será siempre la definitoria, no sólo manifiestamente de la ultraderecha, sino latentemente del capitalismo en general. Ante la devastación capitalista de todo lo vivo, es urgente que la izquierda consecuente, la anticapitalista, supere sus divisiones y recuerde el fundamento de su comunismo, lo que tenemos en común, la propia vida. Somos la vida en toda su incontrolable diversidad interna de sexos, culturas, colores y especies. Esta vida que somos es la amenazada por Bolsonaro, pero también por el capital y el capitalismo a los que desenmascara en su discurso. Aprendamos de este desenmascaramiento para identificar a nuestros enemigos y de paso para identificarnos a nosotros mismos.

Huir del capitalismo: la caravana de los migrantes hondureños

David Pavón-Cuéllar

¿Qué ocurre cuando no ponemos ningún límite al capitalismo y le permitimos hacer todo lo que desea? Ocurre Honduras. Nuestros hermanos hondureños huyen de un sistema capitalista que pocas veces ha obrado tan libremente como en su país.

El capitalismo fueron ya las compañías fruteras de Estados Unidos, la United, la Standard y la Cuyamel, que se repartieron el territorio de Honduras, lo exprimieron todo lo que pudieron, sorbieron sus ríos y la sangre de sus trabajadores, talaron sus selvas y erosionaron sus tierras, desgarraron su tejido social y pusieron a su gobierno en una total subordinación colonial con respecto al capital estadounidense. El capitalismo fue el que hizo de Honduras uno de los países del mundo con mayor desigualdad en el ingreso. Fue también el que abortó cualquier intento de reforma agraria y cualquier estrategia de redistribución de la riqueza. Él fue el que dio un golpe de estado en 2009 contra un presidente, Manuel Zelaya, que se atrevió a pensar en la pobreza, girar a la izquierda y aproximarse a Venezuela. El mismo capitalismo han sido las empresas mineras, energéticas y constructoras, como la DESA y Sinohydro, que se han repartido las tierras y las aguas hondureñas, que saquean los recursos naturales de los indígenas lencas y que han asesinado a Berta Cáceres y a otros 122 activistas ambientales, todo esto con el apoyo directo del gobierno y del Partido Nacional en el poder. El capitalismo es, en fin, el narcotráfico y el crimen organizado que sólo existen para ganar más y más dinero, que se han convertido en uno de los sectores más lucrativos de las economías latinoamericanas y que han hecho de Honduras un verdadero infierno de violencia, con una tasa de homicidio intencional que es dos veces mayor que la de México. Es de todo esto, de todo esto que es el capitalismo, de lo que escapan los hondureños. Es de lo mismo que intentan escapar diariamente, arriesgando su vida, millares de seres humanos en el mundo.

Huir es todo lo que puede hacerse ante algo que se ha tornado tan poderoso que ya no parece haber manera de combatirlo. Es casi como si toda lucha de clases terminara siendo imposible. No pudiéndose luchar contra el monstruo, hay que esconderse de él en el único lugar aparentemente protegido contra él: en su interior, en sus propias entrañas, en los centros capitalistas de Europa, Estados Unidos y zonas ricas de los países pobres.

¿Cómo no recordar aquí el mecanismo por el que tantas víctimas del capitalismo prefieren identificarse con él que defenderse de él? Desde luego que esta identificación con el enemigo puede suceder en la migración interna o externa, pero no es algo que suceda necesariamente: no es lo mismo confundirse con el monstruo que introducirse en él y habitarlo. No es lo mismo estar en él que ser él. Serlo, encarnarlo, nos hace cargar con su culpa, ser tan culpables como él, ser él. Por el contrario, estar en él permite conservar nuestra condición de víctimas y nuestra inocente particularidad, nuestra diferencia, y así, además, como seres diferentes de él, no sólo recobrar al menos una parte insignificante del botín, de lo que es nuestro y se nos ha quitado, sino también, quizás, de paso, castigar al monstruo, envenenándolo de lo que somos, de nuestra particularidad, al nutrirlo de nuestra vida.

Es verdad que el capital es como un vampiro que vive de nuestra vida, pero de nuestra vida ya procesada, transformada, esterilizada, reducida a su aspecto puramente energético, es decir, a pura fuerza de trabajo explotable, digerible por el estómago capitalista. Este órgano difícilmente puede asimilar una vida tan real como la que a veces consigue subsistir en los países “subdesarrollados”, aunque también en zonas marginales y subterráneas de las naciones “desarrolladas”. ¿Y cómo negar que la vida real es dañina para la máquina capitalista? Puede llegar a oxidar sus engranes y obstruir sus conductos. Esto es algo que no parecen ignorar el monstruo y sus elocuentes encarnaciones ultraderechistas. De ahí, quizás, que se esté intensificando el terror ante la migración.

El terror de muchos xenófobos de los países “desarrollados” no es tan sólo el signo de una mala conciencia que espera su castigo, que teme al destino justiciero, que se inquieta por el retorno de quienes podrían exigirle que les devuelva lo que les arrebató y que proyecta en ellos una fantasía de venganza devastadora proporcional a lo que les ha hecho. Además de todo esto, hay aquí algo más que parecen estar presintiendo Trump y sus partidarios y que se refleja también en algunos de sus fantasiosos temores proyectados en la caravana supuestamente “llena de criminales”. Es como si de algún modo supieran que aquellos que se precipitan a la boca del monstruo para protegerse de él, aunque sólo así puedan huir de él por no estar en condiciones de combatirlo, tal vez terminen combatiéndolo de la mejor manera, intoxicándolo con la experiencia de la propia vida, con lo que aparece como un aterrador goce criminal de la pulsión en la reveladora fantasía de la ultraderecha estadounidense.

Jair Bolsonaro en Brasil: humillación y amenaza para toda la humanidad

Artículo publicado en la edición michoacana de Revolución 3.0 el 7 de octubre de 2018

David Pavón-Cuéllar

Jair Bolsonaro, militar y político brasileño situado en la extrema derecha del espectro político, podría convertirse en el próximo presidente de Brasil. Esto debe preocuparnos a todos en el mundo y especialmente en Latinoamérica. La victoria de Bolsonaro no es la de un candidato como cualquier otro.

Para empezar, Bolsonaro no cree en el Estado laico. Proclama que “el Estado es cristiano” y que “la minoría que está en contra” debe “cambiar”. Desde su punto de vista, “las minorías tienen que inclinarse hacia las mayorías”.

La apuesta de Bolsonaro por las mayorías no le impide juzgar la democracia como un sistema político “de mierda”. Ya prometió en el pasado que, si fuera presidente de Brasil, “el mismo día cerraría el Congreso y daría un golpe”. Tiene la convicción de que sólo un gobierno militar podría conducir a un país “más próspero y sostenible”. Describe los tiempos de la dictadura en Brasil como una época “gloriosa”, como “20 años de orden y progreso”.

El único error del régimen dictatorial brasileño, según Bolsonaro, fue “torturar y no matar”. Desde luego que hubo asesinados, al menos 421 entre 1964 y 1985, pero fueron aparentemente pocos. Fue el mismo problema en Chile. Sin duda el dictador chileno Aungusto Pinochet se las arregló para provocar miles de muertes. Sin embargo, según Bolsonaro, “debió haber matado a más gente”.

Aunque prefiera matar que torturar, Bolsonaro no duda en declararse “favorable a la tortura”. Su voto por la destitución de la presidenta Dilma Rousseff, torturada en tiempos de la dictadura, lo dedicó a un torturador, a quien llamó “el pavor de Dilma”, el coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, responsable de centenares de torturas y de al menos 45 asesinatos y desapariciones forzadas.

Es verdad que Bolsonaro muestra cierta inquietud ante los altos índices de crímenes violentos en Brasil, pero estima que “la violencia debe combatirse con violencia y no con banderas de derechos humanos” como las defendidas por los integrantes de Amnistía Internacional, a quienes caracteriza, por cierto, como “canallas” e “idiotas”. Promete que, si gana las elecciones, “todo ciudadano va a tener un arma de fuego dentro de casa”. Cuando se entera de que la policía brasileña es la que más asesina en el mundo, simplemente declara que “tendría que matar más”.

Bolsonaro es abiertamente violento. Ante sus seguidores, en un reciente acto de campaña, empuñó un trípode como si fuera un arma y clamó que iba a “fusilar” a todos los militantes del Partido del Trabajo (PT). Tal vez fuera una extraña broma. De cualquier modo se entiende la preocupación de los militantes brasileños de izquierda, pero no sólo de ellos. Hay otras víctimas potenciales del político ultraderechista.

Bolsonaro quiere a las fuerzas armadas “en las calles” para “hacer frente” a los haitianos, bolivianos, senegaleses y sirios, a los que describe como “la escoria del mundo”. También lamenta que “indios hediondos, no educados”, posean tierras en Brasil. Promete que les arrebatará sus tierras comunitarias a los pueblos originarios y también a los afrodescendientes. Si es elegido presidente en 2018, según sus promesas, “no va a haber un centímetro demarcado para reserva indígena o para quilombola (comunidad con mayoría negra)”.

Bolsonaro es racista. No disimula su desprecio hacia los negros. Dice que no trabajan, que “no hacen nada”, y agrega: “creo que ni para procreadores sirven ya”. Cuando se le pregunta qué haría si uno de sus hijos terminara enamorándose de una mujer de color, tan sólo responde que “eso no ocurriría porque sus hijos están bien educados”.

Bolsonaro se preocupa mucho por el destino de sus hijos en un mundo en el que hay mujeres afrodescendientes y hombres homosexuales. Ha confesado que “prefería ver morir en un accidente” a uno de sus hijos que “encontrarlo con un bigotudo”. Alguna vez admitió que “sería incapaz de amar a un hijo homosexual”.

De manera consecuente, Bolsonaro ha impulsado leyes para criminalizar la homosexualidad. También ha justificado castigos corporales contra los homosexuales. Recientemente afirmó: “si veo a dos hombres besándose en la calle, los voy a golpear”.

El problema no es tan sólo con la homosexualidad, sino también con el sexo femenino. Bolsonaro piensa que fue por “debilidad” que tuvo a una hija y no a puros hijos varones. También considera que no es justo que mujeres y hombres reciban el mismo salario. ¡Las mujeres tendrían que ganar menos! ¿Por qué? Porque puede suceder que se embaracen, lo cual, desde luego, afecta las ganancias de quienes las contratan. Estas mujeres… Una de ellas, diputada, acusó a Bolsonaro de promover la violación. Él repuso que “no la violaría” porque “estaba muy fea” y “no lo merecía”.

Violación, misoginia, homofobia, racismo, violencia, tortura, muerte y dictadura. He aquí la exitosa fórmula de la ultraderecha por la que millones de brasileños están votando. No sólo es un ultraje a la memoria de las víctimas de las dictaduras latinoamericanas y de las olas de feminicidios y de crímenes de odio racista y homofóbico. Es también una humillación y una amenaza, dentro y fuera de Brasil, para los pacifistas, los demócratas, los militantes de izquierda, las mujeres, los homosexuales, los afrodescendientes, los pueblos originarios, los mestizos con sangre indígena y todos los demás que no correspondemos al modelo de macho blanco heterosexual, violento y potencialmente violador, que está por ganar las elecciones del país más grande y poblado en América Latina.

Resulta muy significativo que Bolsonaro, humillándonos y amenazándonos a todos, sea el candidato favorito del dinero, de la finanza, de las empresas y de las clases pudientes de Brasil. Es así como se confirma una vez más que el capital quiere lo contrario de lo que desea nuestra humanidad en toda su diversidad sexual, social y cultural. Somos lo que el capitalismo intenta destruir. Esto es lo que la ultraderecha nos ha revelado una y otra vez. No hay que olvidarlo.